quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

A TRAGÉDIA DE SANTA MARWRS E A RESPONSABILIDADE CIVIL


DECORRENTE.

o infausto acontecimento ocorrido na cidade de Santa Maria, Rio Grande do Sul, que

vitimou 231 jovens, suscita na opinião pública um questionamento - quem é o

responsável? Eu responderia com absoluta convicção - O PODER PÚBLICO e

solidariamente as pessoas jurídicas de direito privado na figura dos seus representantes

legais da banda e do proprietário da boate KISS. A repórter Eliane Cantanhêde, na

reportagem BRINCANDO COM FOGO, publicado na Folha de São Paulo do dia

29.01.2013, na folha A2, indagou várias vezes no texto: "E COMO O PODER

PÚBLICO, QuE AUTORIZA E FISCALIZA, NÃO VIU"? Realmente, o Estado é o

grande responsável por este e por milhares de eventos que ocorrem na realidade social,

em virtude da sua omissão no dever de atuar. A negligência estatal é um procedimento

corriqueiro nos litígios que tramitam perante o Poder Judiciário, tanto é verdade que

mais de 70% das ações indenizatórias que correm na Justiça, o maior cliente dos

julgadores, é o Estado.

A integridade fisica e psíquica da pessoa humana decorre da presença e atuação

concreta do Estado (art. 196 da CF/88). Afinal, a efetividade dos Direitos e Garantias

Fundamentais da pessoa prescritos no artigo 5° da Constituição Federal de 1988

depende substancialmente da atuação do Estado. O STF já afirmou que: "As garantias

institucionais desempenham função de proteção de bens jurídicos indispensáveis à

preservação de certos valores tidos como essenciais". A integridade da pessoa humana é

tida pela Corte Suprema brasileira com um valor essencial.

E, para a concreção dessas atividades fundamentais à sobrevivência do próprio Estado,

exige-se do mesmo presença contínua para disciplinar, fiscalizar e punir o

comportamento desviante das pessoas no ambiente social. Todavia, quando o Estado

neligencia esta importante atividade responde pela sua omissão. O Estado tem o dever

de agir e, na ausência da atuação que produz dano, deverá responder pelo seu descaso!

A mídia no Brasil há muito destaca o papel da impunidade, que nada mais é do que a

omissão do Estado! nos EUA, que exercem uma efetiva fiscalização e punição dos

infratores - o Estado marca a sua presença no ambiente social para assegurar proteção

ao cidadão e para fazer cumprir a lei. "Responde o Estado porque lhe incumbia

desempenhar com eficiência a função. Como não se organizou, ou não se prestou para

cumprir a contento a atividade que lhe cumpria, deixou de se revelar atento, diligente,

incorrendo em uma conduta culposa"(Arnaldo Rizzardo, Responsabilidade Civil, p.

360).

Portanto, se o Estado não cumpriu com o dever que a ordem jurídica lhe impunha e, em

conseqüência desta situação gerou dano, é responsável pelo mesmo. Nesta linha não

destoa o Supremo Tribunal Federal ao decidir: "Com relação à responsabilidade do

Estado, no caso in examen, verifica-se ser a mesma subjetiva, lastreada na obrigação do

Estado de impedir o evento danoso, uma vez que caberia ao ente público a

escorreita fiscalização da obra, a fim de manter em condição regular de uso a

barragem de Camará, sem oferecer riscos à população" (In STF - Ag.Reg. no RE

702. 574/Paraíba). Para corroborar essa tese, o Ministro Joaquim Barbosa do STF, no

julgamento do AI 600.652-AgRlPR, destacou: «a qualificação do tipo de

responsabilidade imputável ao Estado, se objetiva ou subjetiva, constitui circunstância

de menor relevo quando as instâncias ordinárias demonstram, com base no acervo

probatório, que a inoperância estatal injustificada foi condição decisiva para a produção

do resultado danoso". Resta inequívoca a responsabilidade civil subjetiva do Estado em

face da sua notória conduta omissiva, que comporta indenização por danos patrimoniais

e não patrimoniais (danos morais), em face da magnitude das lesões sofridas pelos

familiares das vítimas.

,- .

o jornal Folha de São do dia 30.0l.2013 estampa em sua primeira página a seguinte

notícia: «A Polícia Civil diz que a casa noturna Kiss, em Santa Maria (RS), estava

irregular, tinha vários problemas e não deveria estar funcionando". Ora, se não deveria

estar funcionando, porque estava? Por decorrência do ato omissivo do Estado, que foi

desidioso em seu dever de fiscalizar - faute du service. Dessa forma, resta

inquestionável a responsabilidade do Estado, ao lado da responsabilidade solidária (art.

942 CC) das pessoas jurídicas de direito privado - banda e boate Kiss - que

concorreram de forma eficiente para a produção dos lamentáveis e dolorosos danos que

sensibilizaram Q Brasil e toda comunidade mundial.

CLAYTON REIS ..

Juiz de Direito aposentado do TJPR. Pós-Doutor pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.

Doutor e Mestre pela UFPr - Especialista em Responsabilidade Civil pela DEM. Professor do Curso de

Mestrado do CESUMAR. Professor do UNICURlTffiA, DA UTPr e da Escola da Magistratura do

Paraná, membro Fundador da Academia Paranaense de Letras Jurídicas.

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